quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Vendaval.

Cento e sessenta e oito horas já se passaram... Meu celular ficou silencioso, respirei fundo mais vezes durante o dia, me senti mais tranquila, sem preocupações maiores que me tirassem a atenção, passei a observar as pessoas e seus comportamentos, li mais, estudei mais, fiquei mais tempo em casa. Acordei menos triste, acordei mais pensativa, mais tranquila, menos ansiosa. Pensei mais vezes no que eu disse, pensei antes de falar. Prestei atenção na aula, escrevi mais textos, sorri por coisas bobas. Passei a olhar vagamente pro nada, a conversar mais complexamente, a ignorar conversas e olhares, a me concentrar no pouco pra esquecer o muito. Ouvi as músicas com um ouvido mais crítico, ressuscitei canções que não ouvia há um tempo. Procurei aproveitar as situações cotidianas pra observar minhas próprias ações e tornar essa observação positiva.
Tudo isso mudou... Por fora.
Por dentro, me sinto como num quarto que foi revirado a procura de algo muito valioso. Não sei onde estão as coisas, não me sinto a vontade em mim, há muitos pensamentos confusos e roupas espalhadas pelo chão. Há cheiros no ar, lembranças espalhadas na estante, junto com as folhas de sonhos abertas, rasgadas, perdidas. Assim está meu interior, completamente bagunçado. A culpa não é de ninguém. Dizem que é preciso bagunçar o que estava aparentemente arrumado para conferir nova organização, eu falei isso. Mas sempre que enxergo uma organização, um novo vendaval adentra pela janela sem pedir licença, fazendo cair algumas pilhas de livros e espalhando algumas folhas no chão. Tudo muito subjetivo, impessoal, frio, pensado. Como num ensaio, planejo cada ação minha com medo de sofrer ou de ser transparente demais; a cada olhar, em cada gesto, um pensamento, um ensaio. Há uma tentativa forte de manter organizado o pouco que tenho. Em 168 horas e alguma organização que se preze, tenho sido muito sincera, opaca, fria e reflexiva. Ter um quarto muito organizado em estruturas seguras não me permitiram observar rachaduras no canto do teto ou possíveis infiltrações que apareceram atrás da porta. Tudo isso porque essa organização, apesar de não ser perfeita, estava me mantendo firma nas decisões e nos passos. O vidro da janela ficou mais opaco: assim ninguém enxerga muito facilmente minha bagunça; as tentativas de organização são pensadas e repensadas, de forma que o que sai é o mais sincero possível, fruto sempre do esforço de carregar os livros, catar as folhas no chão, dobrar as roupas. Tudo em silêncio, pelo canto dos olhos, com uma música de fundo e uma seriedade que eu não conhecia em mim. Há cento e sessenta e oito horas procuro os motivos para essa zona no meu quarto. Procuro entender porque não olhar mais uma vez e sentir a esperança de uma nova tentativa; porque não surto e sucumbo ao que sinto... O que sinto? Uma ausência, uma vontade de fazer parte de novo, a percepção de como eu estava conectada a uma outra vida... As pessoas falam isso, tenho reparado. É tudo muito junto, as particularidades ficaram pequenas diante da intensidade. A vida em que coloquei minha felicidade tem tudo muito bem arrumado, as pessoas se aproximam dela de forma segura também, dá pra sentir isso de longe. As pessoas se aproximavam da minha vida porque a outra era seguro? Onde está minha vida nessa história? Onde eu a coloquei pra viver outra? O que faz parte do meu quarto? As pessoas vem até mim porque tenho uma vida segura?
A vontade é encontrar respostas e uma possível organização em outros lugares, em outras conversas, em abraços. Mas a organização desse quarto depende de mim pois vou fazê-lo de forma particular e pessoal, ninguém poderá adentrar nele enquanto estiver essa zona. Visitas não são bem-vindas. Só dá pra ver pela janela. Ou caso haja força e se arrombe a porta.

sábado, 26 de outubro de 2013

Palavras.

As palavras costumavam fluir mais fáceis antes. Claro que há sempre um filtro que separa o que devo guardar ou colocar pra fora. Mas há um tempo aprendi a falar, sem filtro, sem pensar. Confesso que foi um passo e tanto pra mim. Com o senhor do tempo, aprendi a me expressar, mesmo que não quisesse, mesmo que não fosse necessário, mesmo que atrapalhasse tudo. Falar se tornou prática básica da minha rotina e inserir essa prática na vida foi importante.
 Mas como eu disse antes, as palavras costumavam fluir mais fáceis antes. Apesar de falar sempre, falar o que eu sinto nunca foi uma ação muito fácil pra mim, pois sou confusa e paradoxal muitas vezes, e talvez muitas das vezes em que falei o que sinto não foram momentos bons ou não fui clara o suficiente. Muitas dessas palavras não sabem se posicionar, são desequilibradas, não sabem onde ir, são pensamentos soltos.
 Daí que meu interno foi incoerente com meu externo. Aprendi a falar tudo sempre, para me tornar clara, pra fazer fluir, mas pensar "demenos" desequilibrou ainda mais meus pensamentos e causou confusão - ela, senhora das minhas palavras, que saiu de mim pra se abrigar um tempo em outro lugar.
 Eis o motivo do paradoxo...
"Minha desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio", já dizia Clarice. Meu excesso de palavras desequilibradas são o resultado de um silêncio necessário, que eu preciso para organizar meus pensamentos e dar sentido àquelas que me expressam. Não fico em silêncio porque sou obrigada a falar, por mais estranho que seja. O que não era preciso, agora se tornou necessidade, fator de dissolução de agonia, causa para uma paz momentânea. No turbilhão de sentimentos em que vivi, um turbilhão de pensamentos me assolam e com eles um turbilhão de palavras e pensamentos soltos. Desequilibrados, com necessidade de serem remoídos e digeridos.
Então chega... Preciso de equilíbrio entre o interno e o externo. O meu silêncio é um espaço que solidão nenhuma pode se abrigar, mesmo que por vezes outra solidão tenha me feito companhia. Entre o sim e o não, eu opto por mim. Em silêncio.